O I Seminário Internacional de Estudos Linguísticos e Literários das Amazônias foi realizado no mês de novembro de 2017, concomitante com o XI Simpósio de Linguagens e Identidades da/na Amazônia Sul Ocidental: Narrativas, Naturezas e Memórias. As temáticas discutidas voltaram-se para questões relativas às várias narrativas escritas/orais, a partir de memórias de seringueiros, ribeirinhos, indígenas, quilombolas e de migrantes de várias partes do mundo.
Em 2019, o II Seminário Internacional de Estudos Linguísticos e Literários tem como título “Transfronteiras linguísticas e literárias: caminhos e práticas nas Amazônias”. Essa temática constitui-se como desafio para pensarmos as fronteiras não somente como físicas ou mesmo como sinônimo de limites fixos entre territórios, mas como sinônimo de passe livre, de ir e vir, de ser um lugar de transmutação de saberes, onde povos, línguas e culturas se intersectam. O termo transfronteira pode ser acompanhado do verbo transmutar, do latim transmutare. Verbo transitivo direto ou bitransitivo que também significa transmudar, ou seja, concretiza-se como ato de transpassar ou transferir, alterar, modificar, converter ou metamorfosear, fazendo muito sentido quando se trata de espaços fronteiriços, pois fronteiras e seus seres e saberes são como águas de uma mesma bacia hidrográfica que se espalham para mais de um país.
O tema transfronteiras linguísticas e literárias: caminhos e práticas nas amazônias é, nesse momento, bastante oportuno, considerando que o movimento de migração físico interno, o de haitianos, de venezuelanos e de outros migrantes sinaliza para o fato de que não só os sujeitos migram, transpõem, mas migra com eles a aprendizagem feita e refeita no percurso. O migrante que chega às fronteiras amazônicas, vindo de qualquer lugar do mundo, não segue sua rota para outros lugares sem deixar seu olhar e sem levar novos olhares, metaforizando que as margens, bem demarcadas anteriormente, agora são tênues e que as fronteiras são lugares de porosidade e em que se empresta cultura. Ao longo da trajetória é possível arriscar que o sujeito não deseja voltar para uma pátria, deseja apenas ser cidadão de lugar nenhum, mas do mundo. Assim, os sujeitos em mobilidade, levam na bagagem práticas socioculturais e memórias que transpassam fronteiras.
A língua é o veículo responsável por “carregar” simbolicamente toda a bagagem desses sujeitos. É preciso, nesse sentido, fazer emergir as vozes desse território fronteiriço amazônico. As questões linguísticas precisam ser abordadas, nesse contexto transfronteiriço, com a perspectiva da diversidade linguístico-cultural. Essa diversidade é resultado, dentre outros fatores, de uma vasta quantidade de línguas na Amazônia, que têm enfrentado em condições distintas os processos socioculturais da modernidade – línguas indígenas em diferentes estados de preservação e vitalidade, deslocadas de suas localidades de origem para as mais remotas cabeceiras dos igarapés, margens de rodovias ou periferias das cidade, línguas de fronteira, línguas de imigração, línguas utilizadas em comunidade surdas (LIBRAS).
A literatura, acostumada às designações que lhe impuseram de pertencer a esse ou aquele lugar, não tem levado isso em conta e cada vez mais se mostra para o mundo como um elemento, acima de tudo civilizatório, presente em todas as culturas do mundo. A literatura, agora literaturas/literatudos, não mais está presa em territórios ditos berços culturais ou restrita ao cânone, ela se presentifica com muita força em lugares ditos marginais, em povos ditos “incapazes” de escrever literatura, em textos dos que estão à margem, em territórios indígenas, quilombos, em comunidades beradeiras, cruza rios e fronteiras e bubuia em águas sem limites.
A definição teórica de transfronteiras ainda não está suficientemente posta, mas entendemos que transfronteiras são lugares de inclusão de todos aqueles que desejam estar aqui e lá e onde podem ser incorporados novos elementos à identidade de quem se transfronteiriza. Portanto, significa não ter uma cultura única, melhor dizendo: pode-se flutuar nas nossas práticas e em outras práticas, em nossos caminhos e em outros caminhos, abrindo portais para o novo.
Diante desses desafios, o II SIELLA intenta suscitar reflexões e discussões linguísticas e literárias da/na Amazônia, por meio de pesquisas concluídas ou em andamento sobre a temática do evento, preferencialmente, e sobre temáticas relevantes à área de Letras, de modo geral.
10 out 2019